sábado, 9 de abril de 2016

Pausa para a leitura: O Quarto do Sonho, de Renata Dias

   Vez ou outra me deparo nos raros momentos quando alguma pessoa adiciona meu perfil para ser seguido no Instagram. Foi o que aconteceu com Renata Dias (uma escritora?), que por curiosidade fui pesquisar mais sobre ela e descobri um blog e livros publicados além de seu perfil no IG (abreviação de instagram que só fui deduzir após muito tempo). Na realidade ela possui uma trilogia pronta, publicou o primeiro volume em dezembro de 2014 e a continuação em março de 2016.



   O que me chamou atenção foi a temática "soft porn" abordada em seus livros e que tem provocado um alvoroço entre as leitoras (e leitores), nem é preciso citar o que "Cinquenta Tons de Cinza" provocou (e não o li) e acabou decepcionando quando se tornou filme (uma pena!). Estava pressentindo que precisava ler mais um livro, porém, precisava terminar meu terceiro volume de Chapada e encabeçar mais um novo livro. Não teve jeito e dei uma pausa, dessa vez o livro escolhido foi "O Quarto dos Sonhos" de Renata Dias.

   Vamos então às impressões:

   Somos apresentados ao personagem "Gabe" (Gabriel Rocha), um dedicado estudante no ramo da psicologia que, de tão compenetrado, não possuía relacionamentos duradouros com outras mulheres, possuía amigas que o tinham como confidente, inclusive para relatos íntimos. Talvez a mulher que o tenha marcado até aquele momento tenha sido Mel (Melissa), a qual tiveram um romance adolescente que terminou pela falta de interesse de Gabe.

   Pausa: Poderíamos enquadrar Gabe como uma pessoa assexuada, que priorizava seus estudos e consequentemente um reconhecimento profissional (talvez). Digamos que se relacionar afetivamente e sexualmente não passava pela sua cabeça como uma necessidade primordial dos desejos de um ser humano.

   E foi com a pretensão de adquirir conhecimento que Gabe conseguiu uma bolsa de estudos para uma importante universidade nos EUA. Após um mestrado e cursando o doutorado, ele já estava prestando atendimento voluntário num dia da semana e consultas pagas nos demais dias. Talvez tivesse condições, mas ainda vivia em república quando se deparou com um anúncio de alguém se oferecendo para dividir um apartamento.

   Digamos que o inusitado acontece, quem oferecia a divisão do apartamento era Claire, o que indicaria que Gabe seria descartado por ser do sexo masculino, no entanto, não foi isso o que aconteceu entre eles.

   Estou passando tão superficialmente pela história que deveria voltar ao início e comentar sobre o conturbado encontro de Gabe e sua irmã Laura, quando ela o flagrou dormindo com Mel na sala da casa de seus pais. Havia um sentimento de culpa em Gabe e isso o tornava incapaz de interpretar e traduzir o que sua irmã quis lhe dizer, parecia algo enigmático e difícil de ser decifrado.

   Voltando para Gabe nos EUA, ele enfim consegue um quarto, dividindo justamente o apartamento com uma mulher, Claire, a qual fez despertar um interesse pela sua beleza. Havia uma diferença entre eles: Gabe, um psicanalista metódico com suas rotinas bem definidas e sem agitação, enquanto Claire é uma atriz aspirando por peças teatrais e fazendo testes para comerciais de televisão, completamente sem rotina, chegando tarde (na realidade de manhã cedo) em casa e provocando o primeiro susto em Gabe quando isso ocorre.

   Em alguns pequenos e rápidos episódios percebi na leitura cenas "clichês" que não desmerecem o desenrolar da história. Enfim, sempre nos deparamos com algumas ações que se repetem em diversos filmes, não poderia ser diferente com os livros.

   Antes que conte a história toda do livro e isso acabe se tornando um completo "spoiler", abordarei alguns pontos que me chamaram a atenção:

  Como disse no início, o livro possui uma temática "hot" ou "soft porn". Além de algumas cenas detalhadas de sexo com referência aos órgãos sexuais e posições, existe também tabus que alguns casais enfrentam, dentre eles, a masturbação feminina. Gabe se incomodava quando flagrava Claire em momentos íntimos de masturbação. Eu diria que está implícito aí uma necessidade de ter abordado essa questão, que para muitos é polêmica. A mulher não pode ter desejos? Ela não pode se excitar, explorar e tocar em seu corpo? Essa questão não é simplesmente abordada sem sentido algum, quem ler o livro perceberá que mais adiante isso servirá para Gabe "tratar" uma paciente.

   Me surpreendi que Gabe desconhecia brinquedos sexuais/eróticos. Talvez uma boa parcela dos homens também desconheçam, que não existem apenas objetos que simulam o órgão masculino. Mas é isso mesmo, temos diversas realidades e nem todos estão dispostos a conhecer algo novo.

   Como psicanalista, Gabe me pareceu um tanto ingênuo quanto a algumas questões abordadas pelos seus clientes ou até mesmo por conta de algumas revelações, principalmente por ele ter se tornado um "especialista" em relacionamentos. Mas claro, isso é um romance e na ficção é possível. Mas será que não existem aqueles profissionais que ainda não amadureceram o suficiente para lidar com determinados pacientes? Vale a pena pensar nessa possibilidade e dar um crédito à alguns aspectos de inexperiência de Gabe.

   Essa ingenuidade se aflora quando ele aceita em seu consultório Claire como cliente (mas como?). Isso mesmo. Mas não que ele se torne por completo seu psicanalista, na segunda ou terceira consulta já existe uma recomendação para que ela procure outro profissional (e não faça as mesmas coisas que fizeram juntos no consultório).

   Uma das impressões que tive do livro foi a necessidade de se deixar permitir que as coisas fluam, "deixar rolar" dentro do clima entre eles. Gabe se dizia inexperiente, porém, em nenhum momento Claire se mostrava decepcionada com o seu desempenho. Poderia afirmar que a conexão e a "química" entre eles a impedia de encontrar algum defeito? Poderia ser a paixão, o tesão ou o sorriso...

   Por falar em sorriso, também tive a impressão que não foi muito o tipo físico em forma de Gabe que conquistou Claire, era possível notar que o seu sorriso se tornava cativante não somente para ela como para outras mulheres também. Então, homens! Cuidem muito bem de sua saúde bucal por que um belo sorriso é capaz de derreter o coração daquela mulher por quem esteja apaixonado (mas não utilize isso para outros fins!).

   E as cenas de sexo? Hum, tem gente que não gosta de literatura erótica, tem aqueles que leem e fazem cara de paisagem (será mesmo?) e tem aqueles que se excitam e talvez precisem de um momento de privacidade para ler com mais "ênfase". Digo que precisei me conter em determinados momentos, respirar fundo, abstrair para que a cena não "influenciasse" muito. Algumas talvez poderiam ser mais detalhistas, mas foi a opção da autora.

   E existe alguma coisa pervertida? Nós homens sempre pensamos em sacanagem, que nem sempre envolve apenas a relação de um casal. Mas mulher também não pensa? Eu acredito que sim, mas não são todas e nem sempre da forma que nós pensamos. O livro fala de descobertas, de locais muitas vezes inusitados, de surpresas. Quem nunca quis transar numa piscina por exemplo? Ou num cantinho de uma festa? Alguém já deve ter feito isso. Dentre as descobertas, tem uma que Gabe não se deixou permitir e que também é tabu para alguns homens.

   Sabe, por mais inusitado que tenha se formado a relação entre Gabe e Claire, eu torcia para que eles encontrassem um ponto de equilíbrio. Essa relação o faz despertar para alguns problemas do passado, como a discussão que teve com sua irmã, Laura, e até mesmo o quanto perdeu por não ter aproveitado antes os prazeres que uma relação e se permitir lhe proporcionaram.

   Posso estar fugindo da temática do livro? Talvez, mas comentar dele de forma linear e detalhadamente poderia fazer perder o gosto dos interessados em lê-lo também. Eu queria mais era desmistificar essa questão do "soft porn", do romance "hot" que muitas vezes nos deparamos e que tem sido mal visto por alguns leitores do sexo masculino e muito bem aceito pelas leitoras que se interessam pelo gênero literário. Até parece que ninguém assistiu a uma pornochanchada ou simplesmente fecha os olhos quando se depara com uma cena quente numa novela ou filme. Os livros podem ser assim também e por trás do contexto erotizado de algumas cenas há algo que podemos refletir e pensar.

   Poxa, eu acho que escrevi demais e não consegui transmitir 50% das ideias que circulam em minha mente sobre esse livro. Mas enfim, se você chegou até esse trecho aqui é por que se interessou pelo livro e pelo que escrevi. Então, dê uma chance, procura no site da Saraiva, Amazon e adquira seu exemplar de "O Quarto do Sonho" e com certeza se interessará para ler "O Quarto do Conto", segundo volume dessa trilogia escrita por Renata Dias.

   Abraços e até mais!

2 comentários:

  1. Nossa! Também serei "obrigada" a escrever demais...
    Não posso negar que cheguei a me questionar se você tinha curtido a leitura. Sou apaixonada por romances e por ler muito, me policio enquanto estou desenhando personagens e arquitetando o desenrolar de cada capítulo para que não seja influenciada por algo que li. Sinceramente, o amor é clichê e não vejo problema nisso. As interpretações mudam de acordo com o nosso estado. Se estamos apaixonados e ouvimos uma música melosa e carregada de sentimentalismo, é normal que a gente entre em sintonia e se identifique com ela. Se estivermos de mal com a vida e tivermos levado um "pé na bunda", com toda certeza vamos julgá-la brega ou igual a todas as outras.

    Eu escrevia contos há mais de 15 anos e a vontade de publicar meus devaneios surgiu exatamente depois que li a trilogia "50 tons de cinza". Eu queria dar vida a um cara "normal", que não fosse o suprassumo da beleza e nem pudesse comprar o mundo para seduzir uma mulher. Que não tivesse sofrido traumas e nem submetesse as mulheres as suas manias controladoras. Imaginei ela mais tímido, meio nerd e ele jamais poderia se comportar como a maioria dos homens que conhecemos, como o cara que dá em cima de todas as mulheres que se relaciona. Pelo contrário. O que ele queria era ser um cara sério no trabalho, respeitado e se preocupou tanto com a base teórica que talvez tenha esquecido a necessidade de experienciar situações e adquirir traquejo prático. Queria ele humano, cheio de falhas e questionamentos bobos. Queria que ele fosse o retrato de um cara que a gente pode conhecer atravessando a rua ou tomando um café na esquina de casa.
    Já a Claire precisava ser o extremo oposto. Ela precisava virar a rotina dele de cabeça para baixo e pôr em dúvida todas as teses que ele julgava serem inquestionáveis.

    Queria criar situações bem cotidianas com assuntos rotineiros. Sugerir cenas possíveis de ser elaboradas, experiências "triviais", mas que muitas vezes julgamos jamais poder realizar. Apimentar o imaginário dos leitores e fugir do que a gente vê ou lê e rotula como "coisa de novela" ou "só acontece nos filmes".
    Uma das minhas preocupações quando escrevi era que eu sabia a responsabilidade que seria falar sobre temas polêmicos que abrangem a sexualidade feminina, mas considero absurdo o julgamento que algumas pessoas se sentem no direito de fazer quando dizem que quando o homem faz é legal, é correto e está aprovado. E porque é que a mulher não tem esse direito? O de escolher o que é correto para ela... nenhuma verdade é absoluta. O "pecado" existe porque alguém rotulou que um ato era indigno, mas quem tem o poder de definir isso senão a nossa própria consciência?

    Se eu disser que momento algum tive receio que houvesse uma confusão entre erotismo x pornografia, estaria mentindo. Demorei um ano com a trilogia escrita até decidir falar com os meus pais e começar a correr atrás de uma editora. Muita gente pergunta se tenho vontade escrever outros gêneros e sempre respondo que não. Até estou rabiscando um livro com a minha sobrinha de dez anos, mas acho mesmo que não é a minha praia. Vamos esperar para ver o resultado, mas eu gosto de falar sobre sexo e relacionamentos e acho que esse é o meu papel nesse universo cheio de possibilidades!

    Em "O quarto do Conto" o foco muda completamente para a história da Lara e o meu foco principal já é fazer com os leitores consumam a importância de se amarem diante do espelho. De se permitirem ser felizes com o que está ao alcance ao invés de criarem monstros para se boicotar diariamente. Que venham muitos outros e que eles sempre consigam passar as suas mensagens!!

    AH!! E obrigada por explanar a sua visão sobre a obra. Tenho conversado com muitos autores e acredito que temos muito trabalho pela frente, mas tenho certeza que juntos somos muito mais fortes! Vamos em frente...

    ResponderExcluir
  2. Mas é isso, às vezes para nos tornamos diferentes e autênticos precisamos ousar e abusar.
    Parabéns pela sua obra e por ter dedicado tempo para deixar seu comentário. Caramba! Foi praticamente uma segunda postagem e deve trazer uma grande importância para seus fãs!

    Abraços!

    ResponderExcluir